quinta-feira, 28 de janeiro de 2016

Com o tempo


Pela janela eu vejo a água descendo rio abaixo. Ainda chove. E a força da correnteza é como uma avalanche líquida que segue desembestada ocupando todos os espaços que encontra pela frente. Penso nas minhas plantas. Penso nas pessoas que moram à beira deste mesmo rio, alguns aqui bem perto e outros que eu nem sei precisar. Minha mulher já reclamou que as roupas não secam. Meus filhos me dizem que não tem o que fazer nas férias e percebi que até o meu cachorro anda ressabiado.
Há dois anos atrás, eu, este mesmo cidadão que voz fala, vi desta mesma janela este rio secar a cada dia. Chorei sua seca e a morte anunciada de tudo que vivia e dependia do rio. Sequei-me de tristeza junto com o rio naquela ocasião. E agora cá estou eu, preocupado com o estrago das águas ao redor de mim. É da natureza humana querer tudo certo, tudo bonito, tudo no seu devido lugar! Queremos filhos lindos e perfeitos. Queremos parceiros compreensivos e amáveis. Queremos um jardim sempre verde, tardes sempre tranquilas e por-do-sol de fotografia de segunda a segunda.
Perdoa-me Deus. Perdoa-me pelo meu despreparo para as adversidades. Queria eu que a água caísse mansinha, na quantidade certa para encher os rios, encher os potes e as minhas necessidades mundanas. Queria eu que o sol nascesse a cada manhã para secar as roupas no varal, fortalecer a plantação e nos aquecer na medida certa para trabalhar. Oh pobre mortal e ignorante que sou. Eu que a cada dia acordo com um humor diferente. Eu, que nunca me dei conta do uso indevido que fiz da água durante praticamente toda minha vida! Eu que nunca pensei antes de cortar mais uma árvore do caminho. Eu que usei sem medidas a terra que me deste estou aqui pedindo consenso à mãe natureza. Eu deveria aprender que a normalidade dos dias só serve para acariciar a minha mesmice e me manter fincado no mesmo lugar. Aprender que as adversidades me ensinam novas possibilidades. Aprender que as vezes é preciso secar a minha pretensão junto com a seca ou deixar que o meu orgulho escorra na correnteza do rio.
Que seja feito o que tem que ser feito, que tudo chegue no seu tempo e que eu consiga enxergar o tempo bom na chuva que cai. Foi preciso uma seca para eu entender como deveria usar a água, foi preciso uma enchente para eu doar coisas que não me serviam mais. O que será mais que eu preciso para aprender a ser uma pessoa melhor?

Leila Rodrigues

Publicado no Jornal Agora Divinópolis em 19/01/2016 e no JC Arcos em 23/01/2016

Imagem da Internet

segunda-feira, 18 de janeiro de 2016

Amores distantes


Demorei tanto para chegar e agora, que aqui estou, a impressão que tenho, é que sempre estive aqui. Você me é tão familiar que fica difícil explicar. Parece que eu já ouvi seus hiatos, já sei o tempo das suas falas, o tom da sua voz.
Fiquei à vontade antes mesmo de você puxar a cadeira.
E olha que eu ainda não sei quase nada de você e nem você de mim. Mal sei seu sobrenome e você nem sabe onde eu nasci. Ainda nem te contei como foi o parto do meu filho, nem você me disse onde passou suas últimas férias. Mas você sabe me fazer sorrir e eu sei te contar casos que nem para mim mesma eu contei um dia.
Não precisa me levar a lugar nenhum, eu já me sinto, aqui, no melhor lugar. Não se apresse em misturar nossos mundos porque eles já são próximos por natureza. Gostamos das mesmas cores, respiramos os mesmos ares ainda que estejamos a milhares de distância. A força infinita da natureza nos aproximou e ela mesma vai tratar de entrelaçar nossas mãos.
Em meio a milhões de cliques, num deles estava você. Nesse mundo novo, onde tudo é tão instantâneo, tão efêmero, tão moderno, eu não esperava que o sentimento, esse velho avassalador, vencesse. Mas ele venceu. Venceu as barreiras do teclado, venceu as fronteiras do monitor. Venceu o frio da distância e juntou pessoas, uniu casais, formou famílias...
Sim o amor é mesmo inexplicável! Pode surgir de onde menos se espera, de onde nada se espera. De onde não se procura, em momentos que nem sequer imaginamos, lá vem ele tomando conta de nossos espaços. Fazendo amigos, formando parceiros, tribos, grupos, casais... amores.
Mesmo com tantas “porcarias” no mundo virtual, devagarinho fui encontrando as minhas rosas. Pessoas que como eu, tinham propósitos melhores e mais dignos. Pessoas capazes de respeitar o outro e principalmente  a privacidade do outro sem perder o calor de uma grande amizade. 
Ombros que eu nunca vi, colos que eu jamais dormi, choram comigo minhas dores e vibram comigo as minhas alegrias, a milhas de distância. Alguém poderá dizer que este sentimento é menos nobre que qualquer outro ?
Vindos de todos os lugares, de todas as tribos, as pessoas se descobrem próximas, parecidas, unidas, pares. E como um toque de magia, uma cumplicidade inexplicável toma conta de nós. Neste campo imenso de girassol, vivemos a mais pura magia do encontro. Simples como um clique.


Leila Rodrigues

Publicado no Jornal Agora Divinópolis em 11/01/2016 e no JC Arcos em 16/01/2016
Imagens da Internet




Nunca vivi um caso de amor virtual, mas conheço muitas pessoas que sim. Alguns se deram muito mal e outros se deram muito bem. Não sou eu que vou julgar a escolha de cada um. Mas tenho grandes amizades construídas virtualmente. Alguns eu já conheci pessoalmente, outros ainda pretendo conhecer um dia. Não falarei nomes de todos para não correr o risco de deixar alguém de fora, mas foram muitos amigos que fiz no blog e nas redes sociais. Amigos de verdade, que passam para deixar um abraço, que perguntam quando dou uma sumida ou quando posto alguma notícia não muito boa. Não classifico essas pessoas como amigos virtuais, para mim são todos amigos reais, pessoas que eu admiro, respeito e quero muito bem!
No mês passado tive o prazer de conhecer pessoalmente a amiga Ana Cecilia Romeu. Ana Cecília Romeu é publicitária e escritora. Ela acaba de lançar o seu segundo livro, um trabalho infantil belíssimo que vale a pena conhecer que é "Janela da Poesia". 
Aqui uma amostra do seu belíssimo trabalho, em uma crônica encantadora: http://www.grupogaz.com.br/gazetadosul/noticia/463536-da_calmaria_a_tempestade.html
Eu e Cissa nos conhecemos através de outra amiga querida que eu também tive o prazer de conhecer pessoalmente que é a Ma Ferreira, ceramista de SP e uma pessoa muito querida. 
Cissa é tudo aquilo que eu imaginava e muito mais. Inteligente, simpática e divertida, tem um sorriso lindo e uma prosa boa que só. A viagem foi curta e em cima da hora, não deu para conhecer outros amigos que eu gostaria e que também moram em POA. Prometi voltar para demorar um pouco mais e aí sim, abraçar todos os amigos do Sul.

Grande abraço

Leila Rodrigues


segunda-feira, 11 de janeiro de 2016

Cápsula





Olá pessoal,

Sempre que vou à Tiradentes, volto em paz. Não sei explicar a razão disso. Talvez seja a tranquilidade do lugar, ou também as raízes mineiras muito presentes ou será o cenário bucólico e nostálgico que me liberta do cansaço e das preocupações. Enfim, o causador pouco importa.

Este fim de semana estive lá para o casamento de dois amigos. Tudo lindo, a noiva, o noivo, os convidados, a igreja, uma energia boa e um pano de fundo naturalmente perfeito que é a Serra de São José. Na volta, quando tentei escrever alguma coisa a minha leveza era tamanha que a única coisa que consegui escrever foi esta frase.

Às vezes tudo que precisamos é nos libertarmos do cansaço do dia-a-dia, das preocupações mudanas, dos afazeres… e nos deixarmos ser parte da paisagem. Só isso.

Para quem não conhece Tiradentes, fica aqui o convite para conhecer o nosso verdadeiro ouro de Minas. 

Grande abraço


Leila Rodrigues



quinta-feira, 7 de janeiro de 2016

Cápsula




Olá pessoal,

Para ler a crônica na íntegra acesse:



Muito obrigada pela visita e boa leitura!

Abraços


Leila Rodrigues


quarta-feira, 6 de janeiro de 2016

Cápsula



Olá pessoal,

Cápsulas geralmente são usadas para curar nossas dores ou enfermidades. Vivemos no mundo das cápsulas. Hoje existem cápsulas para tudo. Na contramão do mundo dos medicamentos apresento meu projeto Cápsulas. O objetivo é apresentar todo dia uma frase para os leitores do Palavras. 
São frases extraídas de textos ou poemas meus. 
Esta Cápsula é sua! Use-a sem moderação. Pode haver efeitos colaterais, mas eu garanto que serão efeitos positivos. Leia, compartilhe, encaminhe para um amigo, guarde para uma ocasião, enfim… Use-as como for melhor para você! Apenas peço a gentileza de preservar o nome do autor. Um respeito que nós autores lutamos para preservar.
Eu desejo que você não tenha enfermidade alguma, e que estas Cápsulas sejam uma vitamina a mais nos seus dias! Sem bula, sem contra-indicações e sem moderação.

Grande abraço



Leila Rodrigues

domingo, 3 de janeiro de 2016

Para começar vazio



Depois de alguns comendo e bebendo as festas do final de ano, o cansaço era visível. Um dia na casa da mãe, o outro na casa da sogra, depois na casa de amigos e adjacências. Abraços, comemorações, confraternizações. Momentos especiais e importantes na vida de todos nós. Acho que são tão bons por que são raros, rápidos e intensos.
Mas a manhã seguinte é cruel. O dia comum nos espera como um general a postos na porta do quarto. Tudo tem que continuar. Hora de voltar para casa. Hora de fazer acontecer.  E como a maioria, eu tinha que voltar para casa.
Abri a porta e tudo estava lá. No seu devido lugar. Apenas a luz estava um pouco melhor. Talvez pela posição do sol. O dia mal começara e, para alegria de todos, tinha sol. Andei pela casa reconhecendo cada canto. Sim, este sempre fora o meu lugar.
Sinais de mim se apresentavam humilde e silenciosamente. Meus chinelos, meu sofá verde perto da janela, meus livros, meu computador, meu fone de ouvido companheiro de caminhada, minha xícara de café. Do lado de fora minha hortênsia azul pedia água, enquanto a azálea exibia seu esplendor. Todos eles pareciam rir para mim.
Toquei lentamente cada um deles. Minha forma de saudá-los. Abri uma a uma as janelas e portas. Deixei o sol entrar.  Abri as cortinas, liguei o som, trouxe de volta o movimento.
Bem baixinho cantarolei todas as músicas do meu vasto repertório enquanto varria cada canto da casa. Limpei, tirei e joguei fora tudo que não tinha mais valor para mim ou não prestava mais. Vasos quebrados, vidros vazios, perfumes velhos, roupas; pertences que já não pertenciam a ninguém. Certamente servirão para outros. Era preciso esvaziar. A sala, o quarto e o meu coração.
Papéis, muitos papéis desnecessários. Contas que já não contavam mais nada. Restos de histórias, pedaços de situações inacabadas, bancos quebrados, roupas que não serviam mais. Para quê manter tudo isso ao meu redor se já não fazem parte de mim?
Cansada, me recostei no sofá e adormeci. Não sei precisar quanto tempo fiquei ali, dormindo o sono dos vazios. Quem dorme vazio, dorme muito mais. E naquela tarde eu tinha me esvaziado por completo.
Uma boa xícara de café, alguns minutos de silêncio e agora sim, eu estou pronta para começar tudo outra vez. Que venha mais um ano, que venha mais um ciclo e que dentro de nós haja espaço para alguma coisa realmente nova acontecer.


Leila Rodrigues