domingo, 28 de abril de 2019

O holofote e a sorte



O holofote e a sorte

A rede é palco. Com a internet, todos têm a oportunidade de colocar seus avatares neste palco. E o fazem muito bem! 
Não vamos discutir os motivos pelos quais cada um tem o seu avatar; geralmente, são personagens perfeitos, irretocáveis, que estão sempre sorrindo e gozando da mais plena felicidade. Na rede, todos são corretos, éticos, ecologicamente preocupados com o planeta e engajados em alguma causa. Na foto muito bem preparada para “o post”, todos se vestem bem, comem bem, se exercitam, se cuidam e principalmente usam e abusam da palavra gratidão. São todos bem sucedidos, se dizem bem resolvidos e parecem viver um extraordinário caso de amor consigo mesmos. Narciso é tímido perto do que temos visto. A grande maioria não se cansa de falar dos seus diplomas e do quanto tiveram que lutar para chegar onde chegaram. Um pseudo-lugar habitado pelos deuses da competência. Como se o resto do mundo fosse incompetente  e vivesse no andar de baixo dos seus pés dourados. 
Cá para nós, isso existe? Isso é real?  Pessoas que precisam provar o tempo todo que são "fodas" precisam urgentemente de um psiquiatra. Pessoas irretocáveis são insuportáveis! 
Na prática, nós gostamos mesmo é de gente normal. Pessoas que acordam de mal humor de vez em quando, que escolhem o cardápio sem saber o que é, que sentem dor de barriga, dor de dente, dor de cabeça, insônia e por que não, desânimo de vez em quando. Afinal quem nunca? 
É com essas pessoas que não carregam tantas certezas que queremos passar os bons momentos de nossas vidas! Pessoas despreocupadas de provar qualquer coisa ao outro. Porque pessoas verdadeiramente  bem-sucedidas nem tocam neste assunto com ninguém. Pessoas que realmente atingiram a alta performance não estão preocupadas em comparar o resto da humanidade consigo. Elas estão ocupadas demais vivendo, dando e recebendo atenção dos momentos presentes. Pessoas realmente evoluídas não se tornaram um cartão postal de si mesmas. Elas gostam do que fazem, fazem com prazer mas não são escravas do aplauso alheio. Elas geralmente acordam cedo, trabalham duro, choram de vez em quando, sentem medo e tem um extraordinário respeito pelo próximo. Estes sim, são os nossos verdadeiros ícones e eles dispensam holofotes. Eles são ocupados demais para isso. Há quem diga que eles tiveram muita sorte. Eu digo que a sorte adora gente que acorda cedo. 

Leila Rodrigues

Publicado no Jornal Agora Divinópolis e no JC Arcos
Imagem:  https://pt.wahooart.com/A55A04/w.nsf/O/BRUE-8BWTH7/$File/JOHN-WILLIAM-WATERHOUSE-NARCISSUS.JPG

Olá pessoal,

vamos falar a verdade. Ninguém aguenta mais esta turma de narcisos, perfeitamente chata, que circula entre nós. Eles são insuportavelmente perfeitos e na mesma proporção, insuportavelmente chatos. 
Eu gosto mesmo é de gente! De gente que segue em frente, de gente que ri, de gente normal que me permita exercer a minha normalidade junto com eles!

Grande abraço

Leila Rodrigues


sexta-feira, 19 de abril de 2019

Idas e vindas



Idas e Vindas

Eu tinha 13 anos quando me apaixonei pela primeira vez. E foi quando eu entendi que precisava dormir, acordar, estudar, tomar banho enfim, fazer tudo com o coração completamente inundado de alguém. Foi muito difícil! Difícil organizar as ideias, difícil concentrar, difícil não pensar, difícil me desvencilhar daquele ser que tomava conta de mim. Tomava conta de mim, do meu pensamento, do ar que eu respirava. Quase desisti de amar, mas não foi desta vez.

Eu tinha 21 anos quando fui pela primeira vez deixada por alguém. Eu estava em pleno sonho, em pleno encantamento quando tudo acabou. Foi um susto. Um baque! É como um pique de energia no meio de uma festa e quando a luz volta não tem mais ninguém. Faltou chão, faltou ar e novamente o meu coração ficou inundado da falta de alguém. E foi pesado carregá-lo assim tão cheio de mágoas. E mais uma vez, durante um bom tempo realizei todas aquelas tarefas que a vida nos impõe com o coração carregado de dor.

Eu tinha 28 anos quando perdi a minha avó que era uma pessoa muito importante para mim. E eu tive de novo de fazer tudo com o coração inundado da falta de alguém. Os dias eram intermináveis, a saudade parecia um furacão a me corroer por dentro. E viver foi, novamente, muito complicado.

E assim, durante muitos anos eu andei carregando um peso maior que o meu; o do meu coração. Hora cheio de alguém, hora cheio da falta de alguém. Muitos anos se passaram, muitas pessoas entraram no meu coração. Algumas estão até hoje, outros se foram sem deixar nenhum sinal. E ainda tem aquelas pessoas que foram breves mas deixaram rastros eternos. Idas e vindas de minha vida. Coração movimentado esse meu! 

Mas ainda que o preço de amar seja esse, eu prefiro assim. Talvez eu tenha, em algum momento, carregado peso demais. Talvez eu tenha carregado pessoas que já se haviam ido. E muito provavelmente, em algum momento eu carreguei mais do que eu poderia suportar. Mas vivi a alegria de ter um coração ativo. E sei que valeu a pena!

Hoje não conto mais quem entra ou quem sai. Isso deixou de ser importante. Muito menos quanto tempo ficou ou vai ficar. Abri as minhas portas e joguei as chaves fora. Afinal, se são pássaros aqueles que, às vezes, dentro de nós se aportam, que seja pelas suas asas a decisão de ir ou ficar. Se ficarem, que eu não os feche em minha gaiola. E quando se forem, que eu não alimente as suas sombras.

Leila Rodrigues

Publicado no Jornal Agora Divinópolis e no JC Arcos

Olá pessoal,

Pessoas vêm, pessoas vão… É parte do processo. 
O mais importante nisso tudo é compreender que ninguém pertence, de fato, a ninguém. Somos todos de nós mesmos. 
Amar não nos torna proprietários do outro e ser amado não nos torna propriedade de ninguém.
Grande abraço, boa páscoa para quem for de páscoa e muito amor!


Leila Rodrigues

sexta-feira, 12 de abril de 2019

Sem privilégios



Um dia nos damos conta de que ainda falta muito. O status de aprendiz dura o tempo de nossas existências. Embora tenhamos amadurecido, embora tenhamos vivência, experiência, cabelos brancos, anos assentados nos bancos das escolas, grandes livros na cachola e muitas horas de palestras, ainda somos alunos.  Ainda somos assolados pelo medo, pela insegurança e pela vontade imatura de não estar em alguma situação.

A vida nos prepara para viver, mas isso não nos isenta do susto, nem tampouco do sofrimento. Na verdade, nenhum aprendizado nos isenta de nada. Nossos anos de história não significam nenhuma garantia e maturidade, não nos privilegia de passarmos pelas provas da vida. Elas vão acontecer quer queiramos ou não. Elas vão nos surpreender, vão nos assustar e vão nos transformar de alguma forma. A dor nos transforma a ponto de nos sentirmos privilegiados pela oportunidade de evoluir.
Passado o susto, descobrimos nossas forças, nossas potencialidades até então guardadas para a hora certa. Tudo tem a hora certa, até mesmo nossas reações. Só precisamos compreendê-las.
Se tens medo, vai com medo mesmo. Abraça-o e o chame de seu companheiro, mostre a ele que você é a coragem. E caminhem juntos até o final.
Se tens desânimo, estenda a sua mão para o seu próprio desânimo e levante-se! Conduza-o como se conduz uma criança que não sabe onde ir.
Se estás inseguro, segura-te em cada dia, fragmenta seu sofrimento e viva um dia de cada vez. Aceite a batalha diária e considere-se vencedor ao final de cada dia. Pequenas vitórias são pílulas para as grandes batalhas.
Se tens mágoas, atire-as no rio. Ou então escreva-as na areia, bem perto das ondas. Mágoas pesam, mágoas impedem nossa caminhada evolutiva.
Mas se nada disso funcionar, se todas as receitas que a vida te apresentar forem inúteis, não se assuste. O fato é que as saídas sempre estiveram dentro de cada um de nós. E você vai encontrar a sua. Porque a saída é uma porta estreita e singular. É o jeito que cada um de nós encontra para vencer.
Um vai chorar, o outro vai reclamar, o outro vai fazer piada com a própria vida e o outro vai silenciar. No fundo, todos estão usando as suas próprias saídas. É só isso! E está tudo certo.
Em cada um de nós uma história, em cada história um desafio. Para cada desafio uma saída e em cada saída, um jeito especial e particular de vencer.



Leila Rodrigues


Publicado no Jornal Agora Divinópolis e no JC Arcos
Imagem: https://www.portaldoholanda.com.br

Afinal, será que ainda falta muito? Será que estamos sendo únicos em nossas histórias? Esse é meu convite à reflexão dessa semana.

Leila Rodrigues

sexta-feira, 5 de abril de 2019

Acaso ou Destino?



Ele não chegou de trem, muito menos de avião. Simplesmente chegou. Apareceu por essas bandas. Ela não chegou de lugar nenhum. Nasceu e cresceu por aqui. Seu sonho era um dia chegar de algum lugar. Ele sempre sonhou que um dia encontraria o seu lugar. Ele veio para trabalhar, subir na vida.  Ela colecionava perfumes, fazia yoga, terapia, academia e gostava de fotos.  Ele planejava ter um cachorro. Ela planejava ter filhos. Ele já não tinha mais os pais. Ela tinha cinco sobrinhos e quatro melhores amigas.  Ela procurava alguém que procurasse alguém também. Ele não procurava nada, tinha acabado de encontrar o emprego dos seus sonhos. Um dia se cruzaram na rua. Nem se viram. No outro se cruzaram de novo, no mesmo lugar. No terceiro dia perceberam a coincidência e se olharam. Ela reparou que ele estava mal vestido. Ele imaginou como seriam seus peitos. No quarto dia se cumprimentaram. Ela sorriu. Ele a fitou. Ela se envergonhou. Ele desvergonhou. No quinto dia foi feriado, não se viram. Ela ficou a pensar onde ele estaria. Ele ficou a pensar como ela estaria. Ela imaginou que estivesse com alguém. Ele imaginou que ela estivesse pelada. A segunda-feira custou a chegar.  Ela aumentou o decote. Ele aumentou os olhos. Ela o achou mais baixinho. Ele achou um jeito de chegar. Falaram por cinco minutos. Dados básicos. Nome, onde trabalham, coincidências do horário, profissão... Justificaram que estavam atrasados e foram cada um para o seu lado. Ela detestou o tênis dele. Ele adorou a pinta no rosto dela. Ela imaginou quantos anos ele teria. Ele imaginou quantas noites eles teriam.  Chegou o dia seguinte, a mesma hora e o mesmo local. Ele não apareceu. Ela ficou sem graça. Ele jogava xadrez com um amigo. Ela jogava fora a esperança. Ela ligou para as amigas. Ele ficou na esquina jogando conversa fora. Passou a hora, passou o local e quase passou mesmo a esperança dela. Encontraram-se no fim da rua. Ela o achou mais bonito desta vez. Ele a achou mais interessante ainda. Combinaram de encontrar no dia seguinte.  Ela sonhou com o encontro. Ele encontrou os amigos. Ele pediu um chope. Ela pediu licença para ir ao banheiro. Ela falava de si. Ele falava dela. Ele gostava quando ela sorria. Ela sorria quando ele gostava. Ele a achou meiga. Ela o achou forte. Ele quis ficar a sós. Ela quis ficar a dois. Ela sentiu frio, de nervoso. Ele sentiu calor, de nervoso. Ela sentiu que era a hora. Ele sentiu que passava da hora. Abraçaram-se como dois amantes, se beijaram como dois adolescentes, se despediram como duas crianças.
Hoje eles têm dois filhos, um cachorro, uma calopsita, um aquário, um rancho e muitos amigos.
...E vivem como um casal que se ama.

Leila Rodrigues

Publicado no Jornal Agora Divinópolis e no JC Arcos
Imagem: https:// www.novohomem.com

Tem tantas histórias bacanas sobre início de relação. Umas ao acaso, outras encarregadas pelo destino. E a sua como foi?


Grande abraço

Leila Rodrigues